“Cantar estancou meu sangue”
(Itamar Assumpção)
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Uma força é o mundo. Capitalismo global estende suas garras. Toda terra precisa se posicionar. Isso é parte do Brasil.
Outra força é Portugal. Sua visão da terra, sua desvontade de ficar.
Lá, longe, era melhor. Lá era a vida – a civilização.
Aqui, tudo era selvagem. Especialmente ele, o europeu.
Aqui era impôr o parto. Aqui era forçar tudo. Abrir a mata, abrir estradas, abrir as pernas. Aqui era o estupro ‘que fecunda’.
Não, nós não nascemos de romances.
O índio sabe disso. Ele era outra força.
Outra força é o negro.
***
Sua história, aqui, foi escrita em sangue. Indizível.
Pele arrancada, tripas expostas, pernas e braços decepados.
Terror, terror: quem te daria uma imagem desse Brasil?
Mas eles sobreviveram.
Eles sobreviveram.
Eles sobreviveram.
***
Aqui começa o Brasil: injustiça, ignorância e abandono.
E mesmo assim, no meio dessa podridão – que continua! –
Ainda assim somos abençoados.
Ainda assim eles sobrevivem,
espalham suas raízes,
crescem
e nos enchem as mãos de presentes.
Ainda assim…
***
De um lado há o capital. O Português, o civilizado, o índio e o negro.
O negro é o Brasil que deu certo.
Mesmo que, sob um certo olhar, seja o Brasil dos submundos.
Lá crescem suas raízes,
e sua luz, como mãos em prece,
vivifica
lava essa terra,
empresta sua seiva.
***
Há um sopro de vida correndo, aqui, há cinco séculos
Um vento forte que não cessou.
Uma árvore negra, que dá sombra e fruto
E vida
Por toda essa terra.
Generosa, ela traz a semente
de um filho desejado.
Mas querem arrancá-la, essa árvore da vida.
Querem difamar seus frutos.
E ela sobrevive.
***